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Editoriais sobre as condições objetivas e subjetivas da situação política internacional e sua influência no Brasil

Com a palavra, Ediane Dalo, petista de Piraquara, Paraná





Qualquer apresentação que fizéssemos para a entrevista da companheira Ediane, ou Diana, como é mais conhecida, não faria jus ao seu pujante depoimento. Diana vive e milita em Piraquara, uma cidade da região metropolitana de Curitiba, Paraná, com 113.036 habitantes. Leiam o que ela tem a dizer.

C&R: Companheira Ediane, como você se aproximou do PT ?

Ediane: Olha que interessante, eu nasci em 1982, ano em que o TSE concede o registro definitivo ao PT; nós teríamos ainda mais 3 anos de ditadura. Eu nasci em um país que ebulia movimentos sociais e lideranças comunitárias. Por que eu quero registrar esse momento? Porque isso influenciou minha infância, minha formação; recordo do meu pai ouvindo em um rádio que parecia uma caixa de madeira, com 2 botões, um programa chamado "A Voz do Brasil". Mais tarde identifiquei meu pai como de extrema direita. Em 1985, a ditadura se finge de morta pra poder vestir uma roupa nova e circular pelos corredores do Palácio, como se nada tivesse acontecido.
A gente não tinha televisão. Eram só esse rádio e meu pai os canais de informação que tínhamos. Lembro que, em 89, na campanha pra presidente meu pai era cabo eleitoral, sempre envolvido com política e, dessa vez, apoiando o Collor. Eu ouvia muito, das visitas que meu pai recebia em casa, a fala: ele (Lula) come pelas mãos dos outros; e, aqui, tem algo muito peculiar que quero registrar também, que é o gatilho que me liga ao PT. Éramos uma família de pai, mãe, 3 irmãos pobres, uma casinha com 2 quartos e uma cozinha. Vivíamos uma crise lascada, nosso sustento vinha da lavoura, da agricultura e eu fiquei "puta" da cara quando, um belo dia, meu pai chega em casa na companhia de um político influente na cidade e fala pra minha mãe: mata uma galinha e faz janta pra eles. Eu, a mais velha dos irmãos, tive que subir na árvore onde a galinha dormia e pegar ela.
Minha ligação com o PT nasce desse momento, onde nós tínhamos, eu e meus irmãos, ido dormir tendo comido polenta com leite e meu pai oferece a galinha, que era do almoço de domingo, pra virar refeição pra um cara que falava mal do Lula, que repetia uma fala de que, se o sindicalista chegasse ao poder, nós passaríamos fome, o pais iria virar só em greve... Eu desejei que eles perdessem e esse cara, o Lula, ganhasse. Nesse tempo, uma sementinha da esquerda caiu no meu coração e ficou hibernando até o ano de 2002, quando eu começo a trabalhar no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Saudade do Iguaçu/PR e é ano de eleição. Me filio ao partido dos trabalhadores e vou pra rua fazer campanha pro Lula e pra então canditada a deputada estadual, Luciana Rafain. Ando por toda a minha cidade e pelo interior e vejo nos olhos das pessoas o brilho da expectativa de que Lula era o cara que ia mudar o país, como ele sempre propôs, porém nunca tinha sido acreditado. Nesse movimento e acaloramento, a sementinha soube que eu era um campo fértil e se lançou à terra pra ficar. A comoção era geral, o povo tinha entendido que Lula estava certo, que só um trabalhador governaria para os trabalhadores e que Collor mentiu, enganou os brasileiros; que os 2 mandatos do FHC só faziam a gente pagar mais impostos e o preço das coisas no mercado mudavam diariamente. Quem lembra da máquina de cola preço nos pacotes? Foi preciso sentir na pele o peso das escolhas políticas, pra nação dar seu voto pro Lula.

C&R: Fale um pouco sobre a sua experiência com o MST.

Ediane: Eu me considero uma aprendiz política, aprendo sozinha, sem muito recurso; pra aprendiz autoditada o aprendizado vem do choque de realidade, é quando seus conceitos e pré-conceitos são postos à prova. No ano de 2003, na BR que liga Saudade do Iguaçu/Pr a Chopinzinho/Pr, surge um acampamento com 300 famílias de sem-terra e eu, no auge dos meus 21 anos, filiada ao PT, feliz com a eleição do Lula, mas com uma visão estreita sobre o MST, tecia minha opinião embasada pela fala dos outros: sem-terra é tudo vagabundo, vadio, tudo bandido, são tudo sujos, eles são invasores - aqui você percebe uma interferência clássica da ala direitista de criação familiar. O choque acontece no dia que eu vou até o acampamento, recolher uma assinatura e o carro que ia me buscar estraga no caminho. Sem contato, eu fiquei desde as 10h da manhã até quase noite esperando. Com toda minha visão distorcida sobre as pessoas, eu toda nojenta, nem água eu bebia e disso eu me envergonho pra caramba. Um senhor chamado seu Floriano se aproxima e diz: menina não fique aí na beira da estrada, é perigoso, os caminhão passa avuado... Eu estava esperando o carro me buscar, já eram 4 horas da tarde e a barriga roncava de fome... mas bem capaz que eu ia comer num lugar daquele... Seu Floriano pacientemente me chama pra sentar perto do seu barraco, junto com sua esposa e filhos; eu fui, ele me alcançou um "cepo", pra eu sentar; Olhei dentro do seu barraco, era chão batido, a cama era "tarimba", o fogão era um "gipão" e as panelas brilhando de limpas, o cheiro da comida que cozinhava era bom; a filha dele, chamada Janete, me alcançou um prato com aquela comida, "que era com suãn de porco". Eles ficaram olhando pra ver se eu ia comer... eu comi e aqui, eu me emociono toda vez que conto, porque cada colherada que eu engolia, junto ia meu orgulho, meu preconceito! Abri meus olhos e vi muita gente boa, que se sentiu abraçada, acolhida pelo MST, onde eles podiam ainda ter alguma expectativa, quando todas as portas já haviam se fechado. Eu vi muitos sonhos e aprendi a diferença entre solidariedade e caridade: a solidariedade é quando você divide o que tem, inclusive as possibilidades de melhorar de vida e a caridade é aquela que precisa manter a pessoa dependente, pra que você possa mostrar sua caridade. Passei a frequentar mais o acampamento e me tornei uma ponte entre a liderança do acampamento e a prefeitura, pra agilizar lona pra cobrir os barracos, água, comida e escola pra crianças, ali eu conheci meu esposo e futuro pai dos meus 3 filhos. Juntos eu e ele, fui de líder de grupo de 10 famílias a líder de 500 famílias, passando à direção geral de um acampamento de 3 mil famílias, na região de Quedas do Iguaçu/Pr.

C&R: Como está a questão agrária hoje? Em especial, em tempos de pandemia. Como os acampados estão lutando contra o vírus?

Ediane: O MST surge em 1984, junto com o momento de afloração dos movimentos sociais que já vinham influenciando as decisões políticas da época. Um ponto que é de extrema relevância é que a construção do MST é sua independência de ações: o MST não obedece a partidos políticos, mas se assemelha a plataformas petistas e a militância sempre responde a apelos de manifestações, fazendo a sociedade e o poder público olhar para os apelos do movimento social. Assim que acaba a ditadura, em 1985, esse movimento se estende a todo canto do país e vê a desigualdade, a pobreza extrema de uma parcela da sociedade, enquanto outra, bem menor, acumula grandes latifúndios improdutivos, que não cumprem a função social da terra - que é o direito de comer e produzir. O movimento vem com a proposta de ocupar essa terra ociosa e as famílias produzirem o próprio sustento. O MST não pede documento da área, o "taião" destinado à família vem em nome da mulher pra que se cumpra a função social: a mulher responde pela propriedade.
Hoje, a questão agrária entende que houve um avanço, mas todo avanço de proporcionar socialização dos meios de produção é, de regra, que se pague um preço alto. E aí vemos as ações do ministro Ricardo Sales fazendo a regularização fundiária nas áreas de ocupação em geral. Isso atinge a organização do MST, porque em tempos onde os recursos destinados à agricultura famíliar congelaram, o assentado, tendo em posse o documento dessa área, cai na lábia dos finaciamentos de bancos privados que colocam a área como garantia. Os velhos e conhecidos "papagaios": o assentado financia porque não tem mais recurso pra comprar semente, as monocultutas tomaram conta das propriedades e, assim, a fome chega na roça novamente. Diante do caos, o financiamento é uma saída tentadora.
Os acampados estão dentro das condições extremas de exposição, durante a pandemia, pois não há como manter higiene e isolamento necessário, além de uma boa parcela ser composta por pessoas de idade. Mas, mesmo diante dessa realidade, a solidariedade se faz presente nos assentamentos, onde já se produz e abastece os acampamentos; e o movimento tem agentes de saúde. Todo grupo de 10 famílias tem uma pessoa que responde pela saúde dos integrantes, pela educação, pela segurança, pela alimentação. Ele tem vida própria e certamente está lidando muito melhor que outros segmentos da sociedade comum.
O risco maior são os despejos que amedrontam, porque durante o despejo não é despejada só a possiblidade da terra pra produzir: são despejados os sonhos, a independência e a seguridade alimentar.
No Paraná, temos acampamentos de resistência que fazem frente de negociações com o governo do estado pra que seja respeitado o momento de pandemia e não seja feito nenhum despejo. Não se pode relaxar, o Estado tem a polícia e a polícia responde à iniciativa privada, ou seja, aos donos tidos como "legais," dos latifúndios.
Sempre, em formação, a compreensão do que significa fazer parte do Movimento Sem-Terra, o que significamos pra sociedade não é o que ela pensa a nosso respeito. Aprender a lidar com o preconceito é uma tarefa diária, não oferecemos perigo, o perigo ja está em todos os meios, mas somos taxados como o problema do município onde nos instalamos. Sempre há um confronto silencioso instigado por falas políticas e cidadãos que desconhecem isso, assim como eu, um tempo antes de conhecer e fazer parte.

C&R: Quais os problemas do povo trabalhador da sua cidade?

Ediane: Piraquara é um município com problemas que se arrastam desde sempre que é a geração de emprego. Já abrigamos a maior ocupação urbana da região sul do país: as famílias vieram de toda parte, atraídas pela promessa de emprego garantido por causa do parque indústrial em Curitiba. Grande promessa, mas que não suportou a demanda; então, essas famílias ficaram sem nada, sem ter como voltar para o lugar de onde vieram. Piraquara tinha uma grande área desocupada e assim foi se formando o maior acampamento urbano do Sul do país. Em 2007, o então presidente Lula esteve aqui pra lançar o PAC, um investimento de mais de 1 bilhão de reais pro Estado do Paraná, destinados a rede de esgoto e moradias. A cidade vive até hoje sob os resquícios do PAC, porque não houve mais nenhum plano de governo que direcionasse verbas e recursos pra acelerar a economia do município e do país em geral.
O que faz dos munícipes de Piraquara um povo excedente, que se vê obrigado a disputar vagas em outros municípios, com os trabalhadores locais. Temos muitos informais, além do município não contribuir muito com o comércio local, o que certamente geraria emprego, aqui na cidade mesmo. Os grandes atacadores sufocam o comércio local e o município cede à pressão dos grandes monopólios distribuidores. A mão de obra barata é pegada no local mesmo, até porque não temos centro de formação profissional.
Nossa área é de manancial, mas a preservação não é o forte do município já que tem, inclusive, denúncias no Ministério Público de contaminação do lençol freático e aterro de nascentes. Os gestores não pensam em uma agricultura sustentável e que preserve o meio ambiente.
Então, podemos contabilizar as perdas para os trabalhadores desde a formação escolar deles, até a usufruir, conscientemente, de todos os recursos do município


C&R: Como sua cidade está enfrentando a pandemia?

Ediane: Dentro da resposta à pergunta anterior, sobre as dificuldades dos trabalhadores, da minha cidade, há um fio que liga à resposta desta pergunta. Piraquara não tem hospital, temos uma população próxima de 120 mil habitantes e não temos hospital habilitado; temos um, desativado por briga política e, aí, quem paga o pato é a população, que fica refém do medo de disputar leitos hospitalares com outros municípios, que vão inchar o sistema de saúde do Estado, em um estalar de dedos, já que a realidade do Estado como um todo não é lá aquelas coisas. O Paraná é formado de vários pequenos municípios de 5 mil habitantes, outros um pouco maiores mas que não têm hospitais e que recorrem aos municípios vizinhos. As estruturas são sempre as mesmas: 4 ou 5 leitos de UTI pra atender um público de 30 a 40 mil moradores locais, mais os que vêm dos arredores, formando esse número de dependentes do sistema. Então, lá no início, quando a quarentena foi decretada em nível nacional, o governo do estado já sabendo disso, colocou os decretos sobre o Paraná. Mas aí, alguns municípios foram relaxando, por não suportarem a pressão dos comércios locais, isso oriundo da demora da resposta Federal nos auxílios emergenciais, principalmente, inflamados pelo discurso persidencial de que é preciso salvar a economia.
Ouço, principalmente, a fala de que ficar em casa é coisa de petista vagabundo. Há uma guerra de certo e errado, colocando todas as ordens e falas técnicas da agência de saúde como erradas, coisa de comunista e que fazer o que o presidente diz é a coisa certa, é coisa de quem quer salvar o país.
Dentro desse quadro, estamos nós a militância, agindo muito mais que o Estado, porque nós conhecemos nossas cidades, favelas e áreas rurais mais do que ninguém, locais onde o Estado não chega nós chegamos. É isso que choca o governo atual, porque ele fala desconhecendo o próprio país e quando um de nós abre a boca, mostra o que o país é.

C&R: Você ve alguma relação do vírus com o agronegócio?

Ediane: Como uma aprendiz, eu não tenho base técnica para afirmar minha fala, eu não sou uma cientista, mas sou uma pessoa que, pelo instinto de defesa se protege com os meios a que tem acesso. Valorizo o acúmulo de aprendizado que a humanidade passa de geração em geração. É como se a vida humana entendeu o campo hostil ao seu redor e se adaptou, passando essas informações que ficam em nosso inconsciente e despertam, assim que a ameaça se torna evidente. E aqui quero demonstrar como isso funciona, trazendo uma fala da minha nona que tinha pouquíssima instrução e acesso à informação. Dizia pra nós, eu, meus irmãos e primos: a gente não comia essas coisas que se come hoje em dia, salgadinho, refrigerante; a gente nem sabia que existia. Hoje essa piazada come, fica gordo, fica doente e é tudo por causa dessas porcaria, essas comida de pacote e de lata; vem a gente não sabe de onde, nem do que é feito" Veja que ela, sem conhecer o sistema que rege o planeta, que controla todos os recursos e meios de produção, disse que estamos sendo controlados, inclusive pela alimentação. Quer forma mais inteligente e menos suspeita de extermínio silencioso? Ou, então, clientes em potencial? Sim, porque doentes compram remédios. O comportamento e fala da minha nona não deixa de ser um alerta das nossas células transmissoras, passadas de ser pra ser, com um acúmulo de informação sobre coisas que não deram certo, que não fazem bem; elas se comunicam pra se proteger. Lógico que eu não tenho como provar, mas só o fato da minha nona não saber, não conhecer a forma de controle do capitalismo sobre a ciência, a tecnologia e todos os recursos, e ela dar o indício de que a alimentação manipulada representa perigo, sim, é possível que a humanidade corra risco de extinção. Então, a informação e o tempo são nossos aliados.
Olhe o comportamento do corona vírus que, sabemos, já existia. Já tivemos uma amostra de como o vírus dessa família se comporta na pandemia de H1N1: ele se aprimorou e as nações de posse da informação de como ele age, se beneficiam disso. Ele está sendo usado de forma política. A gente pode afirmar que a humanidade é constantemente testada e todo nosso comportamento é anotado para a criação de um novo ataque. Não estou dizendo que a Covid-19 foi criada, mas que sabiam como o vírus se comporta e que na forma que a humanidade se alimenta ele poderia, sim, se desenvolver. O exemplo mais forte é a gripe aviária: o confinamento em massa de animais desenvolveu um supervírus e a informação sempre esteve à disposição, mas as nossas defesas não são ativadas, sempre estamos desprotegidos, acionamos nossas defesas, mas estamos cheios de pontos fracos e é neles que esse tipo de vírus se torna mortal. A sociedade não respeita regras, ela não se organiza pra se defender coletivamente e esse sistema dominador sabe disso; então, usa todos os meios influenciadores e solta eles, cada um com seus seguidores: os que seguem a ciência, a religião, a política e os que fazem a própria leitura de sobrevivência. Esse sistema, que luta também pra não ser substituído, sabe de todos esses controles e quando um ataque como esse do vírus é colocado em ação, com todos esses meios influenciadores sociais pra matar sua cota, é sórdido. Sim, pois o capitalismo é sórdido. Então, a política mata, a religião mata, a ciência mata, porque ela é posta pra trabalhar e desenvolver pro capital; então, ela mata e os que levantam as próprias teorias matam também e aí você me pergunta: Mas como? Se fosse assim, a gente iria identificar esses meios e não os seguiria. Mais aí eu lhe respondo: esses meios... uns mais, outros menos... depende muito da sua organização e poder, se regeneram diante da opinião pública e permanecem, mesmo depois de cumprirem seu papel de desestabilização social e garantir o cumprimento da sua cota de mortos.
O agronegócio é um deles, que se desenvove dentro do setor político. Ele é protegido pelo discurso de seguridade e soberania alimentar, que devemos garantir comida pra humanidade; e, aí, a tecnologia e a ciência são postas pra desenvolver meios de produção em massa.
Se me perguntar se o capitalismo corre risco, eu digo que não, porque ele se reinventa, ele se beneficia do momento. Você verá grandes compras, grandes impérios ruírem e outros se levantando. Então, ele se reinventa, ele renasce. A sociedade é consumista, estamos programados pra isso, todo meio de comunicação está direcionado ao consumo de bens. Veja um exemplo clássico: temos uma pandemia dizimando milhares e, ao mesmo tempo, temos uma sociedade que consome, pela internet, uma máscara de marcas famosas de 3 mil dólares! Você entende o que significa isso?

C&R: O que vc acha que o PT deveria fazer, caso tivesse a oportunidade de assumir um governo de emergência, em meio à pandemia?


Ediane: O PT sempre foi um partido com políticas de esperança, sempre propôs consertar, arrumar aquilo que estava estragado, sempre à mão, como uma alternativa necessária diante dos estragos provocados pelo toque dos tentáculos capitalistas. O PT tem plataformas de desenvolvimento econômico, geração de emprego, aplicação dos programas sociais "o que fica provado, diante da pandemia, se faz muito necessário ampliar e aumentar o valor". Isso acelera a economia e gera consumo interno, aumentando a demanda de fornecimento. Todo discurso petista é e deve ser pautado em vencer o medo e em ter coragem de assumir postos e ter orgulho do país novamente. O PT tem por obrigação recolocar o sorriso no rosto do brasileiro, regatando a vontade de viver.

Lula, quando assume a presidência em 2003, contrariou as expectativas por parte dos críticos e superou a dos simpatizantes. Ele promoveu um grande ajuste fiscal, cortou gastos e aprovou no Congresso mudanças nas regras da previdência pública.O ato falho, a meu ver, foi a mudança do discurso petista durante a campanha, por medo de perdermos as eleições. Neutralizou a identidade petista, a identidade das plataformas de lutas e anseios da base. "A carta de Lula ao povo brasileiro" é a prova disso, Lula foi pressionado a nos fazer abrir mão da nossa plataforma prioritária, pra tirar as vistas negativas que o setor comercial privado tinha de um governo com característica trabalhista. Erramos quando nos afastamos do governo, quando nos afastamos do Lula, acreditando que ele iria fazer tudo sozinho. Falo isso como parte da base. Nós sempre recebemos as informações por último, na verdade somos apenas informados, nunca consultados e é por esse motivo que não conseguimos acompanhar as grandes decisões e votações que nos interessam, que nos atingem.
Há uma falha política de comunicação com o povo brasileiro, reformas importantes são votadas sem que ao menos o povo saiba se o conteúdo é bom ou ruim para o trabalhador, já que essa falha ocorre exatamente com a classe trabalhadora.
Então, se quisermos colocar um governo de esquerda petista, novamente à frente do país, é preciso resgatar a plataforma de origem do partido, lembrar de onde viemos e pra que viemos, resgatar nossa identidade. Somos um partido que tem a força da terra. Então, resgatar a identidade das pessoas com a terra, com o campo, trazer em pauta urgente a agricultura famíliar, a segurança alimentar, geração de renda e alimentos livres de agrotóxico, geração de emprego e renda na agricultura, exploração consciente e sustentável, trazer a reforma agrária que agrega proteção ao meio ambiente, porque somos protetores não destruidores.
Um fator urgente é um meio de comunicação que faça uma comunicação com linguagem acessível para informar e formar nossa base. A esquerda enfraqueceu seu elo com as base quando deixou de se comunicar, As linguagens padronizadas tornam a informação algo cansativo e desestimulante, o padrão não é compreendido por todos e a esquerda, mais que todos, sabe disso, na teoria e na prática. Então, a meu ver, canais como o seu são de extrema importância. Falo por mim, que uso o Blog Ciência e Revolução para robustecer minha fala teórica e agregar valor a minha prática no meio político, onde estou aspirando a uma caminhada. Então, pra mim, são de importância vital canais como este. Mas precisamos mais, precisamos de um meio mais acessível e com didáticas compreensíveis, mesmo pra aqueles que não estão dedicados a um estudo mais profundo.

C&R: Como você acha que o PT deveria se organizar para voltar ao poder?


Ediane: Eleitor petista responde a convocação de imediato, nós temos uma organização interna da militância que nos permite uma resposta rápida. O que precisa ser acertado é pra quem vamos direcionar os votos do Lula, porque há o eleitor que vota no partido e há o que vota no lula e que migra pra outro candidato que se assemelhe ao Lula, mesmo que esse não seja candidato petista. Então, a forma de se administrar esses dois polos conta muito na estruturação de um novo canditato/a. Eu vejo o forçar a volta do Lula como um erro, mas vejo a volta da Dilma como algo que a direita não saiba como lidar. Além de termos o golpe como aliado e Dilma ter a chance de retomar o posto que foi tomado dela, isso é algo que inflama uma campanha de resposta rápida. A experiência do golpe amadureceu Dilma, ela sofreu o golpe por não se deixar manipular, essa é a característica dela. Lógico que qualquer candidato/a que o PT lançar vai enfrentar toda carga criminal que foi agregada ao partido como forma de enfraquecê-lo.

Dilma e Haddad seria minha aposta pra assumir um país fragilizado: uma mãe firme, enérgica mas sensível e doce quando necessário; um professor pra conduzir as novas frentes de educação e de convivência, já que nada mais será como antes.
O que precisamos é decidir quais nomes e que plataforma apresentar pro Brasil. Tendo isso em mãos, o governo Bolsonaro se desfaz sozinho, ele não tem estruturas nem resposta humana pra dar pro país, que ruma ao caos. Aí, é aguardar os caminhos da democracia. É doloroso, mas colhemos frutos. Lógico que vale a observação de que, se nos encaminharmos para um regime ditatorial, será necessária uma intervenção de resposta imediata, uma tomada à força. O confronto seria inevitável. Nos resta confiar nas instituições. "Dormir com um olho aberto e o outro fechado."

C&R: Como está a organização dos petistas em sua cidade? E no Estado do Paraná?

Ediane: O PT/Piraquara não está diferente do PT em nível nacional. Aprendemos com os erros, fizemos algumas alianças que não foram benéficas, mas de intenso aprendizado e aproximação com os integrantes do partido.
Como em todo canto do país, aqui somos oposição a todo sistema de austeridade governamental, além de haver um entendimento de renovação das práticas políticas, um clamor pela moralidade e as mulheres vêm encontrando no partido um campo fértil pra desenvolver nossas próprias plataformas. Tanto que eu, por inúmeras vezes, fui convidada a migrar pra outros partidos ou então questionada de porquê permanecer em um partido "fracassado". A segurança que eu tenho pra dar respostas a essas perguntas vem, não da identificação com as plataformas e bandeiras petistas, vem sim do espaço que eu e outras companheiras temos pra traçar as próprias metas. A gente chega como é e não precisa abrir mão da mulher que se é pra estar ou falar ou ser política. Então, quando uma mulher encontra esse espaço, onde ela tem sua identidade essencial preservada, ela tem força, ela se apoia e, mesmo que caia, ela aprende a se reerguer e dar continuidade sem medo, porque ela é tudo isso por conta própria, não inventaram uma imagem pra ela.
O PT/Piraquara é bem misto, isso oxigena e prolifera idéias, fomenta debates. Como é de leitura de todos, é preciso que esse contato direto com o militante, com a base, seja resgatado. Eles estão só esperando a gente se identificar e isso estamos aprendendo a fazer, pois os acontecimentos nacionais foram de difícil compreensão mas, no mmomento em que fomos entendendo, fomos criando meios de defesa e respostas conciliadoras e de reaproximação do partido com a base. Posso dizer que estamos progredindo e, se posso registrar aqui, é bom que saibam que o nosso eleitor mudou: ele quer mais, ele quer ação, ele quer estar dentro, ele quer fazer parte e nós temos o compromisso e o dever de fazer esta ponte de acesso à política, democráticamente.

C&R: Qual foi o impacto da luta pela liberdade do Lula no PT do Paraná?

Ediane: O Acampamento Lula Livre funcionou como um instrumento didático: ao mesmo tempo que ele tinha função de resistência, de protesto, tinha função de resgate e afirmação, tanto do golpe na Dilma e no governo trabalhista como da perseguição ao Lula.
Um resgate, uma lembrança de que com o patrão, não se negocia, não tem acordo. A Campanha Lula Livre, junto com o documentário da jornalista e cineasta Petra Costa "Democracia em Vertigem," aliado à vazajato com os disparos do site The Intercept, foi o acorde que o país precisava pra entender o que estávamos vivendo, desde o segundo mandato da Dilma. Foi um resgate histórico, foi um ato de identificação com o líder do partido, foi a nação brasileira se identificar com o Lula, movimento esse que incomodava, e muito, a direita bolsonarista. Bolsonaro não consegue manter sua base da forma que Lula manteve a sua e por escolha das próprias pessoas - não por imposição. Porque, mesmo que fosse uma organização do partido orquestrada, articulada, não resistiria mais de 500 dias. A luta resistiu porque houve um entendimento de que o que estava ocorrendo era perseguição política: a forma de conduzir o julgamento foi injusta e corrompida. Foi essa resistência que comprovou e afirmou que tudo tinha sido um plano, um acordo, um grande acordo porque a elite estava se sentido ameaçada pela trajetória da então presidenta Dilma em não interferir nas investigações federais, se preservando a autonomia da PF, característica master dos governos petistas.

C&R: Companheira Ediane Dalo, a palavra é sua.

Ediane: A mulher sempre foi posta como coadjuvante da própria história, nós estamos nos corredores do parlamento, nas secretarias do municípios, nas assessorias dos gabinetes, nos esquemas de laranjas pra desvio de verba pública, estamos preparando discursos de empatia e solidariedade humana de políticos que desconhecem o significado de tais palavras. Nós sempre ficamos na cochia e quando vemos mulheres como Luiza Herundina, Maria do Rosário, Dilma ocupando o cenário politico nacional elas se tornam escadas pra alavancar a subida de outras. Nós deixamos de ficar atrás da cortina pra fazer parte da cena, pois quando uma de nós consegue ocupar seu espaço, todas nós estamos na arquibancada, com um caderninho anotando todos os passos pra usar como ferramenta e estratégia própria pra ocupar o seu espaço.
O protagonismo da mulher na sociedade contemporânea é tema central de todas as formações políticas, porque se entendeu o momento como favorável a uma ascensão em massa de mulheres ocupando espaços, até então, de homogenia masculina. Aí temos um conflito ideológico, onde a mulher é apresentada como uma ameaça ao sistema capitalista, porque ela entende que socializar os meios de produção é, hoje, a fórmula de reestrututar a economia e promover a inclusão social. E, pra conter essa ameaça, o homem é peça chave: primeiro ele reforça as estruturas machistas pra abortar de imediato qualquer surgimento de lideranças femininas, de respostas rápidas. Como sabemos dar soluções a problemas com muita facilidade, por isso somos ameaça, seguindo com o plano de dificultar, quase aniquilar, a participação feminina ou de qualquer organização diversa que se coloque como construtor do projeto social. Essa estrutura é reforçada desde a criação como uma grande estratégia de controle em massa.
A mulher no cenário político incomoda, ela é prejudicial às práticas viciosas e de privilégios. Nós não compactuamos com a sujeira, vivemos limpando, organizando, consertando, dando vida e utilidade a espaços e ferramentas, até então atrofiados pelo sistema. E isso não é bem-vindo no meio político, porque somos praticantes da boa política. Portanto, as mulheres precisam entender que somos a solução e não o problema, que somos ameaça tão grande que eles são capazes de colocar toda uma estrutura funcional como uma barreira social, pra que estejamos tão sobrecarregadas que política não possa nunca ser nossa prioridade. Eles falam de política como algo complexo, porém sabemos que, mantendo a democracia, a política é simples e de efeito rápido: política limpa, séria, comprometida com o povo, não com o interesse do capital.
Quando encontramos um mulher com prioridades políticas ela é uma mulher que abriu mão de vários conceitos sociais e moldes religiosos pra ter uma independência intelectual. Ela fala e se movimenta politicamente, influenciando todos que se identificam com sua intelectualidade funcional e com o movimento político-social.
Eu sou questionada por meninas, mulheres que sentem curiosidade e me perguntam: Diana, precisa muita coisa pra ser política? Claro que não, você só precisa ser mulher, com toda a intensidade que possuímos. Defendemos nossa opinião com unhas e dentes, somos justas, somos fiéis e reconhecemos quando estamos erradas, cada uma no seu tempo - mas isso é característica firme da mulher. É preciso formação e aqui eu recomendo veículos como o Blog Ciência e Revolução, dedicar-se à leitura e interpretação e amar a política. Esses são fatores importantes. Eu pratico minha fala política com quem frequenta minha casa, provoco altos debates políticos. A internet é outro meio de formação e debates pra fortalecer teses e identificar pontos onde eu preciso estudar mais. Mas o amor à politica faz você admirar todas as ações e mecanismos funcionais que fazem da política uma ferramenta de transformação.
Há um acovardamento masculino sendo percebido por nós, mulheres, e espaços vázios tendem a ser ocupados. E, sim, nós estamos querendo ocupar, estamos nos preparando há gerações pra fazer o que de melhor sabemos fazer.
Fazer o país cuidar dos próprios filhos.
Quero imensamente agradecer quem acompanhou a entrevista e, se você chegou a ler toda ela, quero compartilhar a intenção de ter aceitado fazer parte deste projeto do Blog Ciência & Revolução, que é deixar resgistrado pros meus filhos que a mãe deles se colocou à disposição pra se tornar construtora de uma sociedade justa, solidária que conviva e respeite a diversidade, pra que eles tenham um lar humano, um país acolhedor com politicas socias - não de austeridade e autoritarismo.
Busco, como toda mulher mãe, um lugar acolhedor pra que meus filhos vivam e pra isso é preciso que assumamos nosso posto e comecemos a construir, pra que eles deem continuidade.
É por amor a eles.
Um abraço a todos.

Comentários

  1. Que história bonita de observação e crescimento humano. Fiquei emocionada inicialmente e em seguida uma força que só uma mulher consegue passar à outra. Obrigada Chris Granha por me apresentar essa pérola que é a companheira Ediane e C&R.
    Abraços progressistas

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  2. Quando fui convidada eu não sabia a extensão do que tinha acumulado nessa minha caminhada. Te juro que leio releio cada pauta e é como se me descobrisse em cada linha escrita. Quis mais deixar um caminho de migalhas pros meus filhos saberem como se volta pra casa como se constrói uma sociedade justa humana..e que é possível..

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