Pular para o conteúdo principal

Editoriais sobre as condições objetivas e subjetivas da situação política internacional e sua influência no Brasil

ANTIPETISMO - versão brasileira do fascismo: 2. Condições objetivas para surgimento do fascismo

No primeiro artigo desta série analisamos a Encíclica Rerum Novarum e suas conexões com o fascismo e avaliamos que o aparecimento da Doutrina Social da Igreja  está ligado à transição do capitalismo em sua fase liberal (livre concorrência) para sua fase terminal, quando a livre concorrência dá lugar ao monopólio, cartéis e trustes (V. Imperialismo - etapa superior do capitalismo de Vladimir Lenin).  Notamos que o obscurantismo é um traço fundamental  nas ideologias, que legitimam o poder da burguesia. Neste artigo, vamos analisar, à luz da experiência da classe trabalhadora, o aparecimento do movimento fascista e quais circunstâncias levam a esse estranho fenômeno social.

 


Desemprego - condição necessária para o surgimento do fascismo  e suas variantes

 

Certa vez, o físico Albert Einstein, um perseguido pelo macarthismo e pelo nazismo, foi convidado a expressar sua opinião no The New York Times acerca do perigo fascista. Einstein expressou-se nos seguintes termos:

Quase toda a gente neste país considera o regime e o modo de vida fascistas um mal contra o qual devemos nos defender por todos os meios disponíveis. É reconfortante ver os espíritos concordarem nesse ponto. Mas uma tal unanimidade não existe nem acerca da natureza desse perigo nem sobre os meios a mobilizar para afastá-lo. Exprimirei o meu ponto de vista sobre este.  Einstein expressa a sua posição quanto à condição material que gera um campo fértil para o surgimento de um movimento fascista: Eu tive oportunidade de observar a propagação da epidemia na Alemanha. Não é sem dificuldades nem reticências que o homem renuncia às suas liberdades e aos seus direitos. Mas basta que um povo se veja, em grande parte, confrontado com uma situação insuportável para que se torne incapaz de um julgamento são e se deixe abusar voluntariamente por falsos profetas. ‘Desemprego’ é a palavra terrível que designa essa situação. Também o recear do desemprego é igualmente lancinante. Esse texto de Einstein é de 1939. Einstein fez outras manifestações contra o fascismo e o Sionismo, em 1948. Einstein ainda apoiou o professor de inglês Willian Frauenglass quando foi intimado pela Comissão de Caça aos Comunistas do Senador Joseph McCarthy, conhecido por perseguir intelectuais e artistas nos EUA, na década de 1950. Essa prática ganhou o nome de macarthismo, pois a acusação dirigida por McCarthy a seus perseguidos era, precisamente, a de colaborarem com a URSS, ou serem comunistas. Os métodos de McCarthy eram abomináveis: provas forjadas e condenações sem direito a defesa eram o seu padrão de trabalho. E ainda dizem que os EUA são a maior democracia do mundo. Sete anos antes do artigo de Einstein no The New York Times Trotsky, no texto A Vitória de Hitler significaria a guerra contra a URSS, diagnosticava a situação da Alemanha.

 

A Alemanha, em contrapartida, não é um simples caso. A Europa balcanizada em Versailles está num impasse: o nacional-socialismo é para a Alemanha a expressão política concentrada. Em termos de psicologia social, essa corrente pode ser descrita como uma histeria contagiosa, nascida do desespero das camadas médias. Penso aqui nos pequenos comerciantes, artesãos e camponeses arruinados, em uma parte do proletariado no desemprego, nos funcionários e antigos oficiais da Grande Guerra que trazem sempre com eles as suas decorações, mas que não ganham mais o salário, nos empregados de escritórios que fecharam, nos contabilistas dos bancos falidos, nos engenheiros sem emprego, nos jornalistas sem salários e sem perspectivas, nos médicos cujos clientes continuam doentes, mas não sabem como lhes pagar. É interessante notar o ponto de acordo entre essas duas mentes, que pouco tinham em comum, salvo o fato de terem a dolorosa experiência da perseguição política em suas biografias. No decorrer da década de 30 do século passado, Trotsky teve uma importante produção teórica analisando a ascensão do nazi-fascismo e chega à mesma conclusão que Einstein: o nazi-fascismo surge das condições econômicas desfavoráveis ao proletariado; torna-se  necessária uma crise extrema para o surgimento deste tipo de movimento. A humanidade vivia os dias que se seguiram ao colapso de 1929, as potências imperialistas ameaçavam retomar a partilha do mundo, nos termos de Lenin em seu Imperialismo - fase superior do capitalismo. Então, conseguimos determinar o que alimenta o nazi-fascismo: o desespero e a falência econômica, a falta de perspectiva para os trabalhadores. Contudo, o nazi-fascismo não é um acidente da história, a burguesia o usa quando necessário à defesa de seus interesses, como uma das táticas possíveis para a contenção do movimento operário.

 


O nazi-fascismo como arma da burguesia

 

Tentaremos identificar como o nazi-fascismo é usado pela burguesia.

 Trotsky escreve:

Entre a democracia e o fascismo não há 'diferença de classe'. Isso significa, evidentemente, que tanto a democracia como o fascismo têm um carácter burguês. Nós não esperamos Janeiro de 1932 para o adivinhá-lo Mas a classe dominante não vive isolada. Ela encontra-se nas relações determinadas com as outras classes. No regime 'democrático' da sociedade capitalista desenvolvida, a burguesia apoia-se em primeiro lugar na classe operária domesticada pelos reformistas. É na Inglaterra que esse sistema encontra a sua expressão mais concretizada, tanto sob um governo trabalhista como sob um governo conservador. Em regime fascista, numa primeira fase pelo menos, o capital apoia-se sobre a pequena burguesia para destruir as organizações do proletariado. A Itália, por exemplo! Existe alguma diferença no 'conteúdo de classe' desses dois regimes? Se se coloca a questão somente a propósito da classe dominante, não há diferença. Mas se se tomar a situação e as relações recíprocas entre todas as classes do ponto de vista do proletariado, a diferença é muito grande.

 

Nesse texto, Trotsky se opunha à teoria de social-fascismo de Stalin, que colocava a social-democracia e o fascismo no mesmo patamar. Se transpuséssemos esses escritos para o Brasil de 2020, poderíamos associar a socialdemocracia ao Partido dos Trabalhadores; não é incomum o PT ser acusado de reformista por seus detratores que se dizem, inclusive, seguidores de Trotsky. Em geral esses detratores fazem referência à assinatura de Dilma no decreto que regulamentou as ações de segurança: Garantia de Lei e da Ordem, como prova do suposto social-fascismo do PT. Acrescente-se a esta imputação a manutenção do tripé macroeconômico, embora as instituições burguesas tenham usado toda a regulamentação anticorrupção, aprovada pelo próprio PT, no lawfare contra o partido. Mas voltemos a   Trotsky:

 

No decurso de várias dezenas de anos os operários construíram no interior da democracia burguesa, utilizando – e, ao mesmo tempo, lutando contra ela – seus bastiões, suas bases, seus focos de democracia proletária: os sindicatos, os partidos, os clubes de formação, as organizações desportiva, as cooperativas, etc. É importante notar que os partidos operários que atuam no seio da sociedade burguesa, em especial, em um regime de democracia burguesa, o fazem sobre a regulamentação da burguesia, o que implica que as direções deste partido precisam agir de forma adaptada aos limites das instituições burguesas, ainda que venham a ganhar eleições. Trotsky continua: O proletariado pode chegar ao poder, não num quadro formal da democracia burguesa mas pela via revolucionária: isto está demonstrado tanto pela teoria como pela experiência. Mas é precisamente por esta via revolucionária que o proletariado necessita de bases de apoio da democracia proletária no interior do Estado burguês. Foi na criação de tais bases que se reduziu o trabalho da II Internacional, na época em que ela preenchia ainda um papel histórico progressista (Nota de C&R: Aqui fazemos uma análise das diferenças do PT em relação aos partidos oriundos da II Internacional ). A II Internacional é, justamente, a origem da socialdemocracia. 

Correndo o risco de sermos redundantes, reafirmamos que as organizações da classe trabalhadoras são erguidas no interior da democracia burguesa e essas mesmas organizações sofrem pressão do aparato legal da democracia burguesa para se adaptarem ao quadro vigente, como analisamos no texto A Burocracia do movimento operário, Ernest Mandel (análise crítica).  Dito isso, fica mais claro o papel do fascismo que é definido por Trotsky: O fascismo tem por função principal e única destruir todos os bastiões da democracia proletária até aos seus fundamentos. Destrói as organizações da classe trabalhadora, persegue os trabalhadores organizados e, nesse sentido, a socialdemocracia e o fascismo jogam papéis bem diferentes. Ainda que as capitulações da socialdemocracia possam permitir a ascensão do fascismo, suas bases sociais e seus objetivos são contraditórios. Quanto a isso, Trotsky diz:

O fato de que a passagem da democracia para o fascismo possa ter um caráter 'orgânico’  ou 'progressista' (Nota de C&R: aqui eles quis dizer que a passagem entre democracia e fascismo pode ser contínua e coerente; portanto, progressiva e não progressista) não significa evidentemente nada de diferente, a não ser que seja impossível retirar ao proletariado, sem perturbações nem combate, não somente as suas conquistas materiais – um certo nível de vida, uma legislação social, direitos cívicos e políticos – mas também o instrumento principal dessas conquistas; isto é, suas organizações. Assim, essa passagem 'a frio' para o fascismo pressupõe a mais terrível capitulação política do proletariado que se possa imaginar. O que seria a mais terrível capitulação política? Se o objetivo do fascismo é destruir as organizações do proletariado, a mais terrível capitulação seria,colaborar com essa destruição. Nesse sentido, na época do fascismo é fundamental a defesa dos bastiões da classe trabalhadora. Em nossos dias, nos últimos anos, que instituição mais perseguiu as organizações do movimento operário? O judiciário! A Operação Lava Jato perseguiu o PT até quase cassar o seu registro e prendeu Lula injustamente, além de aplicar inúmeras multas abusivas contra sindicatos, em diversas ocasiões. 

 

Quem dirigia as organizações dos trabalhadores nessa época?

Trotsky explica em A Revolução Alemã e a Burocracia Stalinista – os ziguezagues dos stalinistas na questão da frente única (Brochura, item 4): Citamos, segundo o jornal comunista de Frankfurt, que cobre de elogios esse relatório: Os chefes socialdemocratas já estão suficientemente desmascarados. Suficientemente para a oradora, que passou da socialdemocracia para o Partido Comunista (o que, certamente, é honrado), mas insuficiente para os milhões de operários que votam pela social-democracia e toleram em sua cabeça a burocracia reformista dos sindicatosEntão, os que dirigiam eram os socialdemocratas. Trotsky específica: Mas a antiga geração socialdemocrata, que teve a experiência destes dezoito anos, não rompeu com os seus chefes. Pelo contrário, é precisamente na socialdemocracia que sobram muitos 'velhos', ligados ao partido por fortes tradições. É lamentável, evidentemente, que as massas levem tanto tempo para aprender. Mas, na grande medida, a falta é dos 'pedagogos' comunistas, que não souberam desmascarar concretamente a natureza criminosa do reformismo. É preciso, pelo menos, tirar proveito da nova situação, enquanto que a atenção da massas está altamente concentrada sobre o perigo mortal para submeter os reformistas a uma nova prova que será, talvez, desta vez decisiva. Uma outra analogia com o PT aqui é possível , ainda que limitada, pois no Brasil a tradição mais popular,  sindical e operária se encontra nas fileiras petistas. ao passo que os outros partidos, que se reivindicam da classe operária, além de possuírem contingente muito inferior, possuem suas bases sociais, basicamente, em categorias da área de educação. Trotsky cita Lenin em: A doença infantil do comunismo - o esquerdismo: (...) necessidade absoluta para a vanguarda do proletariado, para a sua parte consciente, para o Partido Comunista, de bordejar, fazer acordos, compromissos com os diferentes grupos de proletários, os diversos partidos operários e dos pequenos exploradores (...). Trata-se de saber aplicar esta tática de maneira a retirar e não de baixar o nível de consciência geral do proletariado, o seu espírito revolucionário, a sua capacidade de lutar e de vencer. Entãoa unidade que deve ser feita é em torno da defesa da classe trabalhadora, ou melhor, em torno do direito da classe trabalhadora se organizar. Esse é o ponto primeiro de qualquer frente antifascista. No Brasil, a principal organização da classe trabalhadora é o PT; logo, qualquer frente antifascista precisa ser feita em defesa do PT, contra as instituições que o perseguem. Boa parte das organizações que reivindicam o trotsquismo como seu norteador fazem duras críticas às Frentes Populares e veem essas frentes, sem distinguir suas características, em toda e qualquer situação. Contudo a maioria dessas organizações esconde que Trotsky era favorável a uma frente de Partidos Operários e que a política do Kremlin, dirigida por Stalin, sempre negou essa unidade. 

 

A Frente Popular combate o fascismo?

Trotsky escreve, no folheto Aonde vai a França?:

Naturalmente, na França, acalentou-se durante muito tempo a ideia de que o fascismo nada tinha a ver com o país. Porque a França é uma república, onde todas as questões são resolvidas pelo povo soberano, através do sufrágio universal. Porém, em 6 de fevereiro, alguns milhares de fascistas e monarquistas, armados de revólveres, porretes e navalhas, impuseram ao país o governo reacionário de Doumergue, sob a proteção do qual os grupos fascistas continuam crescendo e armando-se. O que nos prepara o amanhã? Parece que, à semelhança do Brasil/Século XXI, as direções das organizações operárias da França de 1934 também nutriam ilusões em relação ao quadro institucional vigente.  

 

Trotsky continua seu combate dentro dos partidos comunistas para reorientá-los :

Na França, como em outros países da Europa (Inglaterra, Bélgica, Holanda, Suíça, países escandinavos), ainda existe um Parlamento, eleições, liberdades democráticas ou o que resta disso. Mas, em todos esses países, a luta de classes se exacerba no mesmo sentido em que antes se desenvolveu na Itália e na Alemanha. Quem se consola com a frase 'a França não é a Alemanha' é um imbecil sem esperança. Atualmente, em todos os países vigoram as mesmas leis: as da decadência capitalista. É na França que a burocracia do Kremlin opera um giro de 180 graus. Vemos no artigo Frente Popular na França- Revista A Verdade (Revista teórica da IV Internacional, nº 49/50,  agosto de 2006, edição em língua portuguesa) que, em maio de 1934, Maurice Thorres, líder do PCF, foi convocado à Moscou. Dmitrov,  secretário da III Internacional aconselha o líder do PCF a evitar o sectarismo nas relações com os socialdemocratas. No 7º Congresso da Internacional Comunista (III Internacional), a linha da Frente Popular é oficializada. Mas de que se tratava essa tal linha da Frente Popular? Seria uma unidade das organizações que reivindicavam o movimento operário?  Não. Era uma tentativa de Stalin de se aproximar das potências imperialistas, ditas democráticas. A partir de maio de 1934, o PCF abandonou algumas de suas posições, inclusive a posição antimilitarista para se alinhar às posições do imperialismo francês. No Blog, temos um glossário sobre as Frentes Populares, que foi escrito como texto de apoio ao artigo A tragédia da unidade popular no Chile

 

Trotsky rompe com a III Internacional

Em 1933, após os ziguezagues da direção da Internacional Comunista (III Internacional), Trotsky decide convocar a construção de uma nova Internacional; agora, a IV Internacional(V. artigo: Primeira Conferência da IV Internacional, Revista A Verdade, Revista Teórica da IV Internacional nº 49/50, agosto de 2006, edição em língua portuguesa). No texto podemos ver que quatro organizações (Liga Comunista Internacionalista-Bolchevique Leninista, Partido Socialista Revolucionário da Holanda, Partido Socialista Independente da Holanda e Partido Socialista Operário da Alemanha) assinam uma carta pela nova internacional, que diz:

 

Quando Hitler chega ao poder, sem a menor resistência por parte dos 'poderosos' partidos operários um dos quais apoiados sobre a URSS, revelou definitivamente a putrefação interna da segunda e da terceira internacionais. Portanto, a ruptura de Trotsky, que leva à fundação da IV Internacional, deu-se pela negativa da Internacional Comunista no sentido de construir uma aliança entre os partidos operários.

O Brasil de 2020 tem quantos partidos operários, ou melhor, quantos partidos possuem influência na massa dos trabalhadores? O Brasil tem um único partido com esse potencial: o Partido dos Trabalhadores. Nesse sentido, pouco importa se ele é stalinista ou socialdemocrata, ou qualquer outra nomenclatura que possa existir (V. aqui aqui as diferenças entre o PT e a socialdemocracia). 

 

O Programa da IV Internacional e a questão do fascismo 

No dia 19 de junho de 1993,  reunia-se em Paris/França, uma conferência de militantes operários que reivindicavam o trotsquismo. Esses delegados foram a Paris convocados por um informe que perguntava: O Programa da IV Internacional confirmou-se nos fatos? No mesmo espírito desses delegados nos debruçamos sobre esse programa para buscarmos uma linha de ação concreta no combate ao fascismo.

Trotsky analisou, no programa da IV Internacional, a atualidade do imperialismo no período entre guerras. Verificou a enorme bancarrota em que o imperialismo colocou as classes operárias, inclusive nos próprios países imperialistas. Nós analisamos a atual situação do mercado capitalista mundial em diversas postagens anteriores (V. aqui, aqui e aqui). Contudo, é o próprio FMI que compara a década de 20 deste século com a década de 20 do século passado: Em todas as economias, um imperativo chave ─ e cada vez mais pertinente num período de crescente descontentamento ─ consiste em ampliar a inclusão e garantir que as redes de proteção social estejam de fato protegendo os mais vulneráveis, e que as estruturas de governo reforcem a coesão social. Georgieva continua: o agravamento do mal-estar social em muitos países ─ devido em alguns casos à deterioração da confiança nas instituições tradicionais e à falta de representação nas estruturas de governo ─ poderia abalar a atividade [econômica], complicar as iniciativas de reforma e prejudicar a atitude, o que faria o crescimento diminuir para aquém do projetado.

O fundador e CEO do Fórum Econômico Mundial reapareceu confirmando a próxima edição de evento. Apesar da pandemia, Klaus Schwab promete uma edição focada em problemas sociais, tais como o  racismo. Seria, nas palavras do próprio Klaus Schwab, um reinício para o Fórum Econômico Mundial, que tem edições desde 1971. Na edição deste ano (janeiro/2020), Schwab havia divulgado um manifesto defendendo a filantropia e a caridade como respostas aos males do mundo e em conformidade com a Encíclica Rerum Novarum. O apresentador Luciano Huck esteve nesta edição do Fórum Econômico e apoiou abertamente o manifesto de Klaus Schwab: Quando você lê a carta do professor [Klaus] Schwab desta edição do Fórum Econômico, e ela claramente aponta para discutir ideias que possam gerar crescimento econômico com redução da desigualdade, eu adoraria poder ver o país bem representado em painéis além dos painéis econômicos (Nota de C&R: Huck  referia-se à presença de Paulo Guedes, Ministro da Economia do Brasil). Foi apresentado no Fórum como futuro candidato a presidente do Brasil; portanto.  um legítimo representante do capital financeiro internacional e, com o diferencial de ser alguém ligado a práticas assistencialistas.  Assim como a Encíclica Rerum Novarum, Luciano Huck e outros representantes burgueses até ficam enrubescidos diante da barbárie gritante que foi o assassinato de George Floyd, ou dos números da Covid-19, mas tudo não passa de simples hipocrisia. Nesse sentido, resgatamos aqui duas citações do Programa de Transição, de Trotsky, no capítulo Programa das Reivindicações Transitórias nos Países Fascistas:

 

Isto não significa, evidentemente, que a IV Internacional rejeite as palavras-de-ordem democráticas. Ao contrário, elas podem em certos momentos ter um enorme papel. Mas as fórmulas da democracia (liberdade de reunião, de associação, de imprensa, etc.) são, para nós, palavras-de-ordem passageiras ou episódicas no movimento independente do proletariado e não um laço corrediço democrático passado em torno do pescoço do proletariado pelos agentes da burguesia (Espanha). (Nota de C&R: Trotsky refere-se à derrota da Frente Popular na Espanha).

Portanto , em um momento em que existe um perigo fascista, o centro da atividade política  deve ser a defesa do direito à auto-organização popular e à luta contra a perseguição política pois, no capitalismo, a palavra democracia tem um significado muito preciso para o trabalhador: é o direito de se organizar livremente.  Trotsky continua:

O fascismo lançou esses países no campo da barbárie política. Mas não modificou seu caráter social. O fascismo é um instrumento do capital financeiro e não da propriedade latifundiária feudal. O programa revolucionário deve apoiar-se sobre a dialética da luta de classes, que é válida também para os países fascistas e não sobre a psicologia dos falidos amedrontados. Em que medida poderíamos transportar essas palavras de Trotsky para a realidade de meados de 2020, em meio à pandemia? Podemos estabelecer o PT como principal perseguido, logo a defesa do partido e a defesa do direito a auto-organização popular coincidem, neste caso. Assim, quem deseja a superação do PT, ou a sua extinção, neste momento joga um papel ao lado do fascismo .  Como bem dizia Trotsky:


Sob a influência da traição e da degenerescência das organizações do proletariado nascem ou se regeneram, na periferia da IV Internacional, grupos e posições sectárias de diferentes gêneros. Possuem em comum a recusa de lutar pelas reivindicações parciais ou transitórias, isto é, pelos interesses e necessidades elementares das massas tais como são. Preparar-se para a revolução significa, para os sectários, convencerem-se a si mesmos das vantagens do socialismo. Propõem voltar as costas aos 'velhos' sindicatos, isto é, às dezenas de milhões de operários organizados, como se as massas pudessem viver fora das condições da luta de classes real! Permanecem indiferentes à luta que se desenvolve no seio das organizações reformistas, como se pudéssemos conquistar as massas sem intervir nesta luta! Este trecho tem uma especial atualidade quanto a partidos e organizações que atualmente reivindicam o trotsquismo na sua variante morenista. São organizações antipetistas, que conseguem odiar mais o PT do que as organizações da própria burguesia, negando mesmo a existência do imperialismo. (...) Recusam-se a distinguir, na prática, a democracia burguesa do fascismo, como se as massas pudessem deixar de sentir essa diferença a cada passo! 

Essas organizações desprezam as pequenas conquistas da classe trabalhadora e estão sempre atentas para denunciar os dirigentes, sem propor nada que os substitua de fato, como se fossem dotadas de uma superioridade moral. 

Os sectários só são capazes de distinguir duas cores: o branco e o preto. Para não se expor à tentação, simplificam a realidade. Recusam-se a estabelecer uma diferença entre os campos em luta na Espanha pela razão de que os dois campos têm um caráter burguês. Pensam, pela mesma razão, que é necessário ficar neutro na guerra entre o Japão e a China. Negam a diferença de princípio entre a URSS e os países burgueses e se recusam, tendo em vista a política reacionária da burocracia soviética, a defender contra o imperialismo as formas de propriedade criadas pela Revolução de Outubro.Trotsky continua, como se visse os partidos brasileiros que dizem estar à esquerda do PT:

Incapazes de encontrar acesso às massas, estão sempre dispostos a acusá-las de serem incapazes de se elevar até as idéias revolucionárias. A esterilidade dessas organizações as levam a repetir sempre os mesmos erros , como o conhecido 'Ele Não', que ignorava a existência da perseguição contra o PT e seus militantes.

Uma ponte, sob a forma de reivindicações transitórias, não é absolutamente necessária a esses profetas estéreis, pois não se dispõem, absolutamente, a passar para o outro lado do rio. Não saem do lugar, contentando-se em repetir as mesmas abstrações vazias. Quanto a isso, comentamos no texto acerca do ForismoOs acontecimentos políticos são para eles ocasião de tecer comentários, mas não de agir. Como sectários, os confusionistas e os fazedores de milagres de toda espécie recebem a cada momento chicotadas da realidade, vivem em estado de contínua irritação, queixando-se sem cessar, do 'regime' e dos 'métodos' e entregando-se a intrigazinhas. Em seus próprios meios exercem, ordinariamente, um regime de despotismo. A prostração política do sectarismo apenas completa, como sua sombra, a prostração do oportunismo, sem abrir perspectivas revolucionárias Na política prática, os sectários unem-se a todo instante aos oportunistas, sobretudo aos centristas, para lutar contra o marxismo. Recomendamos também a leitura do texto Bolsonaro e a insuficiência do poder destituinte.

 

Em defesa dos núcleos de base do Partido dos Trabalhadores

Trotsky escreve no Programa de Transição:      

Em parte alguma a burguesia se contenta em utilizar apenas a polícia e o exército oficiais. Nos Estados Unidos, mesmo nos períodos 'calmos', mantêm-se destacamentos militarizados e bandos armados particulares nas fábricas. É necessário acrescentar a isto, atualmente, os bandos de nazistas americanos. A burguesia francesa, à primeira aproximação do perigo, mobilizou os destacamentos fascistas semilegais e ilegais até no interior do exército oficial. Bastará que os operários ingleses aumentem de novo seu ascenso para que imediatamente os bandos de Mosley dobrem, tripliquem, decupliquem em número e iniciem uma cruzada sangrenta contra os operários. A burguesia dá-se claramente conta de que, na época atual, a luta de classes tende infalivelmente a se transformar em guerra civil. Os magnatas e os lacaios do capital aprenderam com os exemplos da Itália, da Alemanha, da Áustria, da Espanha e de outros países, muito mais do que os chefes oficiais do proletariado.

Aqui no Brasil, isso ficou explícito com a invasão do Hospital Ronaldo Gazola, no Rio, por uma horda de bolsonaristas estimulados, pelo próprio Bolsonaro, a verificar da forma mais truculenta possível, a quantidade de leitos ociosos, que deveriam ser destinados ao tratamento da COVID-19.  Em resposta a essa política,Trotsky propõe:

 

Os PIQUETES DE GREVE são as células fundamentais do exército do proletariado. É de lá que é necessário partir. Por ocasião de cada greve e de cada manifestação de rua, é necessário propagar a ideia da necessidade da criação de DESTACAMENTOS OPERÁRIOS DE AUTODEFESA.

Esses comitês de autodefesa devem apoiar os trabalhadores atingidos pela pandemia, apoiar os trabalhadores vítimas de perseguição política. 

 

Organizar a luta dos trabalhadores 

O site da CUT registra a greve dos entregadores que, frente à resposta negativa das empresas, planejam uma nova greve para o dia 12 de julho. Não existe outro caminho para a classe operária, que não a resistência aos ataques do imperialismo. Porém, vitoriosa ou derrotada essa luta precisa ter como resultado o aumento do nível organizacional da classe trabalhadora.  Nesse sentido, a proposta dos comitês de greve de Trotsky, no Programa de Transição, tem uma enorme importância. Voltaremos a essas questões no terceiro texto desta série. 

Comentários